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Receita não pode tributar peças para embarcações

Uma das decisões beneficia o Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima, que reúne 48 empresas do setor.

Autor: Adriana AguiarFonte: Valor Econômico

Companhias de navegação e estaleiros têm obtido decisões judiciais que impedem fiscais da Receita Federal de cobrar Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Importação sobre peças e componentes vindos do exterior e destinados ao reparo de embarcações. Por lei, essas mercadorias têm direito à isenção desses tributos. Porém, para obtenção do benefício, o Fisco tem exigido a comprovação de inexistência de produtos similares nacionais.

Uma das decisões beneficia o Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima, que reúne 48 empresas do setor. A liminar foi proferida pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região. Na 24ª Vara Federal do Rio de Janeiro, um estaleiro obteve sentença favorável. Ambas as decisões impedem a Receita de impor essa condição para a liberação de mercadorias importadas.

O sindicato e o estaleiro reclamam nas ações que alguns fiscais da Receita Federal de portos e aeroportos, principalmente no Rio de Janeiro, não têm liberado a entrada dessas peças sem o pagamento dos impostos, mesmo com a isenção prevista em lei. Segundo o advogado do sindicato e do estaleiro, Eduardo Kiralyhegy, do escritório Negreiro, Medeiros & Kiralyhegy Advogados, pelo menos cinco empresas associadas tiveram esse problema.

As empresas alegam na ação que a Lei nº 8.032, de 1990, que trata de isenção do Imposto de Importação, e a Lei nº 9.493, de 1997, que concede isenção do IPI, não exigem a comprovação de inexistência de produto similar nacional. De acordo com Kiralyhegy, o parágrafo 6º do artigo 150 da Constituição é claro ao dizer que a isenção de imposto só poderá ser concedida mediante lei específica, como ocorre no caso. A Fazenda, por sua vez, argumenta no processo que a determinação para comprovação de que não existem produtos nacionais semelhantes está expressa no Regulamento Aduaneiro ao tratar das isenções previstas no Decreto-lei nº 37, de 1966.

O pedido do sindicato foi negado na 4ª Vara Federal do Distrito Federal. Porém, a desembargadora Maria do Carmo Cardoso, do TRF da 1ª Região, deu provimento ao agravo de instrumento. Para ela, os produtos retidos pela Receita realmente possuem isenções de impostos expressamente previstas na Lei nº 8.032 e na Lei nº 9.493, sem que para isso haja a exigência de comprovação de que não há produto nacional similar. Ela cita precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedendo o benefício em um caso que envolve também peças para reparo de embarcação. Ainda verificou que estão presentes o requisitos para se conceder a liminar, diante da urgência da situação, já que há um alto custo de armazenagem dessas mercadorias.

Desde a decisão, proferida no início de agosto, não houve mais relatos por empresas associadas de problemas na entrada dessas mercadorias no país, segundo Kiralyhegy. "As companhias que preferiram depositar judicialmente ou administrativamente os impostos poderão reaver esses valores, caso a decisão a favor do sindicato seja mantida", diz o advogado.

Já o estaleiro conseguiu, inicialmente, liminar para o desembaraço aduaneiro de dois resfriadores de fabricação holandesa, para instalação em embarcação de bandeira brasileira. Para isso, alegou que corria o risco de ter que arcar com elevados custos de armazenagem da mercadoria - em torno de R$ 20 mil - e sofrer com os prejuízos decorrentes da não execução de um contrato celebrado com a Petrobras, já que a embarcação não estaria reparada no período combinado. Assim, depositou judicialmente o montante integral do Imposto de Importação exigido pela Receita para que os equipamentos fossem liberados.

Ao analisar o mérito, o juiz Alfredo de Almeida Lopes entendeu que as leis que preveem situações para a isenção dos tributos prevalecem sobre o decreto utilizado pela Receita para exigir a comprovação de inexistência de produtos similares. Assim, declarou a nulidade do auto de infração sofrido pela companhia. A sentença foi publicada na quarta-feira.

Para o advogado tributarista Maurício Faro, do escritório Barbosa, Müssnich & Aragão, as normas específicas que estabelecem isenção dos tributos têm que prevalecer, como ocorreu nas decisões. Até porque a intenção do legislador, ao conceder o benefício, era evitar a paralisação da indústria naval, já que não há produção suficiente de produtos desse tipo no Brasil.

Procurada pelo Valor, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que "não se manifesta por se tratar de demanda judicializada". A Receita Federal não deu retorno até o fechamento da edição.